quarta-feira, 17 de setembro de 2008

O Pássaro sem Patas

(O pássaro ao tomar o vinho do esquecimento,
Quis esquecer para sempre que tinha patas,
Agora voará a vida inteira, num canto torto,
E só irá parar quando morto.)
(...)

(Ela não mora mais aqui,
Mas ainda penso nelas todos os dias.)
(...).

(Por um momento eu a tive,
Mas deixei ela escapar.)
(...).

Havia uma promessa de um reencontro,
Uma promessa que se manifestava somente no meu imaginário.
Num estágio, entre noites e dias, entre um pensamento precário.
Entre meu desejo de um encontro num último plano.

Havia uma dinâmica de destino,
Que tendia a se cruzar sempre que se perdia a esperança.
E sempre que se perdia a esperança,
Uma relação estava a caminho.

Uma relação abstrata,
Que de concreto apenas à vontade do espectador.
Uma vontade de haver algum desengano, alguma dor.
Alguma coisa para afastar o amor que não acaba.

Quando de fato nos encontramos,
Tivemos uma continuação de uma paixão embriagada.
Pois foi e talvez ainda seja uma paixão represada,
Quando de fato nos afastamos.

(Depois que tomou o vinho do esquecimento,
Esqueceu de suas patas e voou a vida inteira.
Como numa gigante gaiola vazia, voou,
Atrás das suas lembranças perdidas.)
(...)

(Ela não mora mais aqui,
Mas ainda penso nelas todos os dias.)
(...).

Há todo momento relembro o passado,
E neste momento deixo transparecer a confusão presente.
Talvez tentando recuperar as lembranças no vazio vigente,
Deixando que meus sentimentos me causem um efeito retardado.

E ao sentir vontade de chorar,
Contemplo-me triste apenas nos dias subseqüentes.
Não encontrando o ajuste do tempo entre o amor e as razões freqüentes,
Sinto vontade de chorar.

(Por um momento eu a tive,
Mas deixei ela escapar)
(...).

Havia uma promessa de reencontro,
E o seu corpo era a concentração perfeita da nossa intimidade.
Que ao ser experimentado ao extremo em meio a nossa felicidade,
Fez-me sofrer de uma exaustão precoce, nosso último plano.

O ápice do nosso desejo,
Era igualmente apreciado à vontade de nos repelirmos.
O corpo cansado pelo o prazer que repetíamos,
Era na certa a convivência do ato sexual já sem ensejo.

Foi assim que se deu e ainda se daria o nosso amor,
Como uma aventura poética de fugas e retornos.
Aquele nosso impulso de se libertar um do outro,
É que nos fazia visualizar a ilusão de um pouso, enganando a dor.

(E o pássaro que quis voar a vida inteira,
O pássaro que só para quando morto.
Agora se entristece com a ausência de pouso).
(...).

1 comentário:

Alice Venturi disse...

Eu simplesmente adoro tudo o que você escreve. E é sempre como se fosse a primeira vez.

ADoro.

Meu beijo.