sábado, 26 de julho de 2008

Incerteza?


“É preciso calibrar o meu cristal. É preciso definir com mais exatidão os limites desse meu olhar observador nem sempre tão preciso. É preciso sair desse mundo de faz de conta que às vezes eu finjo habitar para ver de perto a realidade crua das coisas. Ando precisando ver o mar. Realinhar meu ascendente com o planeta da vez. Tentar enxergar com mais clareza o que nem sempre é fácil de se ver. Apesar de toda essa miopia, ainda sou muito boa com as coisas do invisível. Ainda tenho o tato apurado e o olhar de laser a assinalar o obstáculo lá na frente. Mas às vezes tudo isso falha e eu tropeço do mesmo jeito como era quando criança, correndo uma vez atrasada pra escola. Nunca esqueci desse tombo. Por causa de uma garrafa de suco de caju quebrada e por causa dessa cicatriz horrorosa que carimba orgulhosa esse meu joelho esquerdo. Ainda hoje me lembro da sensação de desespero que é perceber o chão esvair-se dos pés. Um soco no estômago. Uma falta de ar não anunciada. E é assim até hoje, quando eu acho que roubaram o meu carro. Quando eu perdia uma das minhas lentes de contato. Quando eu recebo uma notícia terrível. E quando você me olha assim demorado. Então eu respiro fundo e tento não perder o foco de todo o resto. Tento não me deixar levar por esse frenesi passageiro e incrédulo a sacudir nossa ponte. Tento não cair. E tento não te derrubar com todas essas minhas confusões de libélula perdida. Batendo a cabeça na janela.

Tentando.

Tentando.


Tentando.


Por de trás das minhas lentes, o mundo parece tão bonito.

Pena eu não conseguir atravessar de uma vez a espessura delicada desse nosso vidro de granito.”

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